Nota Pública do Fórum de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas de SC

O Fórum de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas de Santa Catarina vem a público lamentar vídeo que vem circulando nas redes sociais imputando supostos excessos nas fiscalizações de trabalho escravo realizadas nos últimos anos na atividade econômica da colheita de cebola em municípios de Santa Catarina.

Primeiramente, não se desconhece a importância e o destaque da região do Alto Vale do Itajaí na produção de cebola. Região esta que concentra diversos empregadores e produtores rurais sérios e que contribuem na geração de empregos e no crescimento econômico do estado. Alguns produtores rurais, entretanto, insistem em descumprir a legislação, utilizando-se de mão de obra análoga à escravidão em seu processo produtivo.

Nesse contexto, anualmente, vários trabalhadores vêm de outros estados do Brasil para plantio e colheita de cebola em Santa Catarina, com promessas de ótimos salários e boas condições de trabalho. No entanto, algumas vezes, acabam surpreendidos com realidades muito diferentes daquelas prometidas, se deparando com condições degradantes, jornadas exaustivas, não recebimento de salários, cobrança de supostas dívidas de deslocamento, alimentação, alojamento, etc.

Nos últimos 5 anos, quase 100 (cem) trabalhadores foram resgatados pelas autoridades públicas na colheita da cebola, por se encontrarem em condições análogas às de escravo, sendo que mais de 40 (quarenta) foram resgatados só em 2020.

A atuação das Órgãos Públicos nas forças-tarefas de trabalho escravo, além de objetivar que sejam garantidas condições mínimas e dignas de trabalho aos empregados rurais, privilegia o bom empregador rural, aquele que respeita as leis trabalhistas, na medida em que evita a concorrência desleal no setor, ocasionada pelo desatendimento à legislação por alguns produtores rurais.
O trabalho em condições análogas às de escravo é crime previsto no art. 149 do Código Penal, sujeitando o explorador às penas nele previstas, além da responsabilidade civil e trabalhista.

Vale reforçar que o trabalho escravo contemporâneo tem contornos via de regra distintos daquele vivenciado no passado. As algemas dão lugar às supostas dívidas de moradia, transporte e alimentação com o empregador; à apreensão de documentos pessoais do trabalhador com a finalidade de mantê-lo no local de trabalho; às jornadas exaustivas; a condições degradantes de trabalho, incluindo de alojamento, dentre outras situações previstas em lei.  Os elementos caracterizadores são verificados nas fiscalizações, com a tomada das providências cabíveis.

Por fim, importante lembrar que o aliciamento ou o transporte de trabalhadores de outras regiões do Brasil para submissão a trabalho em condições análogas às de escravo configura o crime de tráfico de pessoas previsto no art. 149-A do Código Penal Brasileiro, com as penas nele previstas.  

Sendo assim, o FETP/SC conta com a colaboração da sociedade e dos produtores rurais da região do Alto Vale do Itajaí no combate a esta chaga social que é o trabalho escravo contemporâneo, assim como no enfrentamento ao tráfico de pessoas.

O FETP/SC que subscreve a nota nasceu em 2019 por iniciativa conjunta do Ministério Público do Trabalho em Santa Catarina, Ministério Público Federal, Defensoria Pública da União, Polícia Rodoviária Federal, Polícia Federal, Secretaria de Desenvolvimento Social do Estado de Santa Catarina, Secretaria de Inspeção do Trabalho do Ministério da Economia, Polícia Civil e Polícia Militar. Hoje  já reúne outras instituições parceiras, como OAB/SC, Ministério Público de Santa Catarina, SENAC, Cáritas, Rede um Grito pela vida, Instituto Trabalho Decente, OIM, A21, ACNUR, engajadas no objetivo de ampliar e aperfeiçoar a atuação estatal, em cooperação com entidades da sociedade civil, no enfrentamento ao tráfico de pessoas, assim como na prevenção, no recebimento e encaminhamento de denúncias, no fortalecimento da atuação em rede, na atenção às vítimas e na redução de suas vulnerabilidades, tendo apoio, inclusive,  dos produtores rurais da região no combate ao trabalho em condições análogas à escravidão e ao tráfico de pessoas.

Florianópolis, 27 de julho de 2021.

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